As lentes com que enxergamos o mundo
O que você vê não é tudo o que há...
Marcelo Tempesta, PhD
10/14/20259 min read


O que você vê não é tudo o que há...
Estamos apenas nos primeiros passos de nossa jornada de reflexões Tempestando, mas já é hora de recapitularmos um pouco do que já conversamos sobre a importância de contextos e percepções – e de seus poderes de influenciar e moldar nossas realidades em todas as áreas da vida.
Você que já está conosco nesta aventura de aprimoramento e transformação, sabe que este parágrafo inicial é uma “deixa” para algo que sempre enfatizamos: “O óbvio deve ser sempre reforçado, pois constantemente ele é ignorado das mais variadas formas.” E para você que está chegando agora – apreciamos a sua conexão, pois juntos nos tornamos melhores e mais fortes. Cada vez mais você irá perceber o poder do simples e dos óbvios transformadores de vida que a maioria das pessoas ignora. Justamente por ignorá-los, esta mesma maioria não vive a vida plena que tanto deseja – a vida que verdadeiramente, lá no íntimo, ela considera que vale a pena ser vivida...
Dito isso, vamos iniciar nossa recapitulação sobre “contextos e percepções” estimulando nossas mentes com uma citação de Marco Aurélio: "Se uma causa exterior te perturba, a tua aflição não vem desta causa, mas sim, do teu juízo a respeito dela. Em teu poder está a possibilidade de diluir esta aflição." Essa sabedoria nos provoca a questionar: de onde vêm nossas aflições, nossas escolhas, nossas realidades? A resposta está na qualidade do nosso pensamento crítico, que determina a qualidade das crenças que abraçamos, das opiniões que formamos e das ações que tomamos.
David Hume em seu livro “Investigação sobre o Entendimento Humano” nos alerta que: "O hábito é o grande guia da vida humana." Hume nos convida a examinar as crenças que aceitamos automaticamente, pois, sem reflexão crítica, elas moldam comportamentos que podem nos afastar de nossos objetivos. Muitas vezes, acreditamos em coisas de qualidade duvidosa porque não dedicamos tempo ou esforço para avaliá-las profundamente - fato este que Kahneman explora profundamente em sua obra “Rápido e Devagar – Duas Formas de Pensar”.
Essa superficialidade gera opiniões frágeis e condutas desalinhadas, resultando em realidades distorcidas. Em termos práticos, aquele resultado que você ainda não conquistou – seja na carreira, nas relações ou no bem-estar – pode estar bloqueado por crenças desalinhadas que, sem o filtro do pensamento crítico, desencadeiam ações incoerentes.
Vamos reforçar este processo: a qualidade de tudo o que a gente acredita é determinada pelo nosso grau de pensamento crítico. Consequentemente, a qualidade de nossas opiniões e ações em relação ao que quer que seja será correspondente. Por exemplo: muitas vezes acreditamos em coisas cuja qualidade é duvidosa, não é das melhores. Coisas que não avaliamos adequadamente de forma mais profunda, que não fizemos um esforço adicional para aprendermos mais a respeito. Esta superficialidade faz com que nossas opiniões sejam proporcionalmente superficiais, construídas de forma duvidosa, sem fundamentações coerentes, não tão boas quanto achamos que em nossas cabeças elas são... Consequentemente, nossas tomadas de decisões, escolhas e condutas não serão muito diferentes disso, impactando as diferentes áreas de nossas vidas de forma similar.
Em outras palavras, crenças distorcidas geram comportamentos distorcidos, que por sua vez geram realidades distorcidas. Então pense comigo: sabe aquele resultado que você ainda não tem, em qualquer área da vida que queira considerar? Pode ser que você ainda não tenha ou não está como você realmente gostaria, devido a algumas coisas que você acredita estarem desalinhadas, fazendo todo o resto desalinhar também. O aprimoramento do pensamento crítico é o que nos ajuda a resolver esta questão – nos ajuda a enxergar que o que vemos não é tudo o que há. E a partir do momento que nos permitimos mudar as lentes com que enxergamos o mundo, todo o nosso mundo começa a mudar...
Decida lutar contra a rigidez mental
Kelly McGonigal, psicóloga e autora do livro “Os Desafios à Força de Vontade” (The Willpower Instinct), explica que mudar nossa mentalidade é essencial para transformar comportamentos: "A maneira como você pensa sobre si mesmo e suas escolhas determina o que você pode alcançar." Essa perspectiva se alinha com o famoso conceito de "mentalidade de crescimento", muito bem trabalhado pela psicóloga Carol Dweck em seu livro “Mindset: A Nova Psicologia do Sucesso.” Dweck distingue a mentalidade fixa — que vê talentos e habilidades como traços inatos e imutáveis — da mentalidade de crescimento, na qual desafios são vistos como oportunidades para desenvolvimento, e o esforço é o caminho para a maestria.
Essa ideia ressoa ainda mais profundamente com o defendido por Angela Duckworth em seu livro “Garra: O Poder da Paixão e da Perseverança” (Grit). Inspirada em Dweck, a autora argumenta que o sucesso não depende apenas de talento inato, mas de uma crença profunda na capacidade de melhorar por meio do esforço contínuo, na persistência e paixão sustentada — uma visão que transforma desafios em oportunidades de aprendizado, obstáculos em combustível para o progresso. Como diz Dweck: “A opinião que você adota a respeito de si mesmo afeta profundamente a maneira pela qual você leva sua vida.”
O pensamento crítico, nesse contexto, nos capacita a identificar e corrigir crenças limitantes, alinhando nossos juízos com nossos desejos mais profundos e fomentando a "garra" necessária para persistir diante de obstáculos, como Duckworth demonstra em seu livro ao compartilhar evidências de estudos longitudinais sobre alunos e atletas de elite que superam falhas ao adotar essa melhor mentalidade.
As armadilhas do ritmo hipnótico
Continuando com o tom provocativo, fica evidente a necessidade de aprimorarmos nosso grau de pensamento crítico quando nos aprofundamos mais sobre o assunto ritmo hipnótico, algo que sempre esteve presente ao longo de nossa existência e está cada vez mais dominando o nosso dia a dia.
Desde a obra O Príncipe, de Maquiavel, analisada mais recentemente por Jacob Petry em seu livro Poder e Manipulação, até o livro Mais Esperto que o Diabo de Napoleon Hill, a história nos mostra como o ritmo hipnótico com seus ciclos viciosos e automatismos maléficos pode nos privar do livre arbítrio e da construção e desfrute de uma vida mais próspera.
Jean-Jacques Rousseau, no livro “O Contrato Social”, argumenta que a verdadeira liberdade é conquistada quando nos libertamos das cadeias impostas pela sociedade e por nós mesmos: "O homem nasce livre, e por toda parte está acorrentado." O pensamento crítico é a chave para romper essas correntes, permitindo-nos exercer um livre arbítrio mais consciente. Como Napoleon Hill nos ensina: "Nossa força maior está no poder de controlar e direcionar nossos pensamentos para onde quisermos." Deixar a teimosa, danosa e nociva rigidez mental de lado e se abrir para o conhecimento é por si só um ato de aprimoramento e emancipação - um primeiro passo para sair do estágio irreflexivo do pensamento crítico, onde a maioria das pessoas infelizmente está.
Uma pergunta fundamental para a nossa jornada
Você realmente está fazendo suas escolhas ou estão fazendo por você? Você está exercendo seu livre arbítrio ou está sendo conduzido e condicionado sem perceber à automaticamente reagir e tomar decisões de forma irreflexiva e inconsciente? O aprimoramento do pensamento crítico ilumina nossa mente, revela e nos protege melhor do que pode nos prejudicar, nos empoderando para uma vida melhor.
Adam Grant, no livro “Pense de Novo – O Poder de Saber o que Você Não Sabe”, nos inspira ao dizer: "Não me lembro de outro momento da história em que repensar tenha sido tão essencial." Ele destaca que “tradicionalmente, a inteligência é vista como a capacidade de pensar e aprender. Porém, em um mundo turbulento, há outro conjunto de habilidades cognitivas que pode ser mais importante: a capacidade de repensar e desaprender." Outro ponto que Grant relata é que "preferimos a facilidade de nos agarrarmos a visões antigas à dificuldade de compreender ideias novas." Ou seja, esse apego à rigidez mental é o que nos mantém presos ao ritmo hipnótico, tomando decisões irreflexivas que moldam realidades limitadas.
Uma pausa para falar um pouco mais deste fantástico livro de Grant, que já deixo como forte recomendação para todo mundo - A obra embasa muito do que iremos refletir ao longo da nossa jornada e considero mais um livro divisor de águas na vida de qualquer pessoa que esteja na busca por algo a mais, na busca por melhorias e resultados em qualquer área da vida.
Saiba que cada um de nós é o que é e está onde está por causa do conhecimento adquirido e principalmente colocado em prática até o momento. Para cada um se tornar uma melhor versão de si e ir muito mais além - é preciso evoluir. Sair do estado de rigidez mental e ser um eterno aprendiz. Livrar-se da prisão que pode ser viver apenas do que um dia aprendeu e ponto final, para continuar escrevendo histórias que podem ser cada vez melhores. Permita-se, pois todos podem ser, fazer, ter e sentir muito mais do que acreditam ser possível.
Mas voltando... Barbara Fredrickson, pesquisadora das emoções positivas e autora de livros como “Positividade” e “Amor 2.0”, reforça que cultivar emoções positivas, como a curiosidade, expande nossa capacidade de considerar novos contextos e percepções: "As emoções positivas ampliam nosso repertório de pensamentos e ações, construindo recursos duradouros." O pensamento crítico, nesse sentido, é um exercício de verdadeira curiosidade, abertura mental e questionamento, que nos protege de manipulações e nos empodera para escolhas mais conscientes e coerentes para a construção da vida que sonhamos viver.
Marco Aurélio nos oferece outra pérola para esta linha de raciocínio: "Observações seguidas de análises criteriosas nos são necessárias diariamente, ainda que sob pequeninas coisas ou fatos." Essa prática diária de reflexão é o que nos permite avaliar contextos e percepções com maior clareza e imparcialidade. É o que nos permite identificar novas perspectivas, assim como as que sempre estiveram presentes, mas sequer enxergávamos. E até mesmo a considerar em nossas “equações” as que antes muitas vezes ignorávamos.
Estendendo estes pensamentos para o contexto social, Emmanuel Levinas, filósofo do campo da ética, adiciona uma dimensão moral a essa reflexão: "A responsabilidade pelo outro é o fundamento da nossa humanidade." Para Levinas, o pensamento crítico não é apenas pessoal; ele nos torna responsáveis por construir realidades que beneficiem não apenas a nós mesmos, mas também aqueles ao nosso redor. Essa responsabilidade exige humildade para reconhecer que não sabemos tudo - e como Sócrates nos ensina: "Só sei que nada sei, e o fato de saber isso me coloca em vantagem sobre aqueles que acham que sabem alguma coisa.”
A visão que você adota para si
Esta linha de raciocínio que estamos construindo em relação a contextos e percepções é uma fase de preparação e conscientização inicial para uma melhor compreensão do quão essencial é o aprimoramento do nosso pensamento crítico. Um nivelamento para melhor aproveitarmos o que está por vir.
Aproveito o momento para deixar uma recomendação que tem tudo a ver com o conteúdo que estamos abordando e acaba servindo como ferramenta complementar para uma melhor compreensão: o filme “Ponto de Vista” (Vantage Point). Além de um bom entretenimento, filmes também são excelentes fontes de aprendizado quando ajustamos nossas lentes para isso. Para as mentes mais curiosas e treinadas, ensinamentos podem vir dos lugares mais inesperados e inusitados - Guarde isso!
A trama, que mostra um mesmo evento sob múltiplas perspectivas, ilustra como diferentes contextos geram diferentes análises, interpretações e tiradas de conclusões, assim como diferentes atribuições de significados e, consequentemente, diferentes tomadas de decisões, escolhas e condutas. Serve como excelente analogia para reforçar a importância do pensamento crítico: ele nos permite considerar uma multiplicidade de ângulos, avaliar a validade de nossas crenças e escolher comportamentos que reflitam nossos valores mais profundos.
Mas voltando ao “X” da questão – como já mencionado, Carol Dweck nos lembra que acreditar na nossa capacidade de aprender é o que nos mantém em movimento: "A visão que você adota sobre si mesmo afeta profundamente a maneira como você conduz sua vida." Se nossas crenças estão distorcidas, nossas opiniões e ações seguirão o mesmo caminho, impactando negativamente nossa realidade.
O pensamento crítico melhora nosso discernimento, permitindo-nos avaliar não apenas os contextos e percepções que adotamos, mas também a lógica por trás deles. Ele nos desafia a nos questionar e a assumir a responsabilidade por nossas escolhas. Ao exercermos o pensamento crítico, tomamos as rédeas do nosso livre arbítrio, protegendo-nos de pensamentos e crenças inadequadas e erráticas, assim como de influências negativas e manipulações que nos conduzem a decisões irreflexivas. Em outras palavras – assumimos um maior protagonismo da nossa vida.
Para finalizar, a urgência de desaprender e a repensar nunca foi tão clara. Como dizia Sócrates, o saber é o maior bem, e a ignorância, o maior mal. Em um mundo complexo, onde crenças rígidas e automatismos nos limitam, o pensamento crítico é nossa bússola. Ele nos capacita a ser eternos aprendizes, a escrever histórias mais ricas e a construir realidades mais alinhadas com nosso potencial. Permita-se a abrir espaço para o novo. Como dizia Wayne Dyer: "Mude o modo como você olha para as coisas, e as coisas que você olha mudarão." Escolha ser o maestro da sua orquestra mental, direcionando seus pensamentos, sentimentos e comportamentos para uma vida mais plena.
Marcelo Tempesta, PhD.